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Mulheres na Xilogravura

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Em uma postagem anterior, falei da invisibilidade a que as mulheres foram relegadas ao longo dos anos ao ponto de a palavra Xilogravadora simplesmente ser ignorada pelo Google, o site de pesquisas mais acessado no mundo. Também falei, no início dos trabalhos neste blog, do preconceito e dos ataques sofridos, aparentemente de forma combinada, durante reuniões entre os detentores da Literatura de Cordel e seus bens associados, incluindo uma tentativa grotesca de silenciamento, ou Mansplaining , seguida da acusação de ser uma "infiltrada", pelo fato de não ser cordelista, mas xilogravadora. Lamentavelmente, tais ataques não mobilizaram o ecossistema do cordel em São Paulo, e nenhuma retratação pública foi feita.  Para cima do medo, a coragem. Para cima do preconceito, o trabalho e o respeito pela arte.  Por isso, e por tudo que enfrentamos, de cabeça erguida e consciência tranquila, a iniciativa do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular do Rio de Janeiro, entre os dias 4...

Contos encantados do Brasil

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Um dos livros que mais gostei de ilustrar foi, sem dúvida, Contos encantados do Brasil, publicado em 2022, com o selo da Aletria. Este livro reúne contos recolhidos pelo companheiro Marco Haurélio da tradição oral baiana. Optei por ilustrá-lo com a técnica da xilogravura, inspirando-me nas gravuras quinhentistas de Dürer e em Gustave Doré. A editora apresentou duas opções de capa, assinadas por  Caroline Gischewski, responsável pelo projeto gráfico, a partir de duas propostas minhas: uma capa colorida e outra em duas cores.  Abaixo, compilamos trechos do prefácio escrito pelo autor, Marco Haurélio: Se perguntarmos a alguém por que faz determinado gesto, ele poderá não saber o motivo, e talvez responda que o faz “inconscientemente” ou aprendeu com outra pessoa… que aprendeu com outra pessoa, que aprendeu com outra… De forma semelhante, os contos ditos tradicionais se propagam. Ouvimos, repetimos, lembramos, esquecemos, ampliamos, reduzimos. Contamos. E, quando contamos, tr...

Como a xilo entrou no cordel?

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  Uma pergunta que sempre me fazem quando ministro minhas oficinas é: quando a xilogravura entrou na literatura de cordel? Quem pesquisa tanto o cordel quanto a xilo afirma ter sido no ano de 1907, quando o famoso poeta popular e editor Francisco das Chagas Batista (1882-1930) fez uso de uma gravura retratando o cangaceiro pernambucano Antônio Silvino (Manoel Batista de Morais) na página interna de um folheto de sua autoria. O título da obra de 48 páginas, bem resumido, era simplesmente Antônio Silvino , mas vinha com uma farta descrição: “A história de Antônio Silvino, contendo o retrato e toda a vida de crimes do célebre cangaceiro, desde o seu primeiro crime até a presente data – Setembro de 1907”. Por que Chagas Batista teria optado por uma página interna e não pela capa, como seria mais lógico? Talvez pensasse que, ao estampar a imagem somente no “miolo” do folheto, estimularia o público a comprá-lo, para conhecer o retrato do famoso facínora. Mas isso é só uma especulaç...

A peleja da Xilo com a IA

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Corujinhas . Xilogravura produzida durante oficina ministrada pelo mestre J. Borges.  Foto: Thiago Lima. Nasci em Bom Jesus da Lapa, a meca sertaneja, segundo Euclides da Cunha, e cresci numa comunidade rural, a Agrovila 07, hoje parte do município de Serra do Ramalho. Cresci brincando nos quintais, ouvindo versos das cantigas de roda, as histórias imateriais narradas por minha bisavó Maria Magalhães Borges, que me criou desde o nascimento, e os enredos criativos da literatura de cordel. Vi, muitas vezes, meu avô materno, Pedro Pardim, carpinteiro de ofício, beradeiro do São Francisco, transformando madeira em canoas, remos, colheres de pau, vasilhas e até carros de boi. Era um processo demorado, que exigia muitos cuidados, feito com apuro e respeito. Acredito que minha vocação como xilogravadora tenha vindo daí, ainda que tenha começado para valer nessa arte somente em 2017. Há gravuras que exigem mais tempo, da pesquisa ao entalhe até a impressão. A madeira, com seus nós e irr...

Vidas em Cordel, uma exposição para a história

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Foto: Guilherme Sai. A exposição Vidas em Cordel é, sem dúvidas, um marco na história da poesia popular e em minha caminhada, como produtora cultural e xilogravadora. Idealizada pelo Museu da Pessoa, em celebração aos 30 anos deste importante repositório da memória nacional, reúne depoimentos colhidos ao longo de 30 anos adaptados para o cordel.  Jonas Samaúma. Acervo: Museu da Pessoa . Os primeiros folhetos foram escritos por Jonas Samaúma, cocurador da exposição, com xilogravuras de Artur Soar; depois, Marco Haurélio e eu fomos convidados para a criação de textos e imagens que abarcassem o universo do cordel em consonância com a história dos entrevistados.  Nomes como Ailton Krenak, Gilberto Dimenstein e Roberta Estrela Dalva aparecem ao lado de outros não tão conhecidos do grande público, mas igualmente importantes, afinal, como diz o lema do Museu da Pessoa, toda história importa. E toda vida dá um cordel. A exposição percorreu cidades da Bahia, incluindo o Museu Afro, em ...

Xilogravadora, a palavra que não existe

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Se você buscar no Google a palavra xilogravadora vai se deparar com os seguintes resultados: Exibindo resultados para X ilogravador Ou Será que quis dizer Xilogravador ? Se insistirmos, com base na palavra digitada na caixa de pesquisa, o Google é mais generoso: Em vez disso, pesquisar por xilogravadora E, aí, a coisa começa a se complicar para o “nosso” lado: Resultados da pesquisa Dicionário Definições de Oxford Languages · Saiba mais xilogravador /ô/ adjetivo substantivo masculino 1.            ARTES GRÁFICAS•GRAVURA m.q. XILÓGRAFO. Semelhantes Xilogravurista Sobre xilogravadora , a palavra digitada, o Google, nos primeiros resultados, não só não nos dá resposta alguma, como direciona toda a pesquisa para o universo masculino. Ou seja, para o Google, ou melhor, no Google, nós, mulheres da xilogravura, não existimos. Sabemos que o Google apenas reproduz, em seu banco de dados, o que é comumente publica...

Aspectos da Festa do Divino Espírito Santo

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Esplanada do Santuário do Bom Jesus. Missa de Pentecostes, 2014. Acervo: Péricles Itamar A Festa do Divino Espírito Santo surgiu, segundo a lenda, por obra e graça da rainha Isabel de Aragão (1271-1336). Isabel, filha do rei Dom Pedro III, de Aragão, e esposa de D. Dinis, rei de Portugal. Passou a ser Rainha Santa Isabel em 1625, quando foi canonizada. Dentre as suas virtudes miraculosas está  O milagre das rosas . Dedicada à caridade cristã, a rainha saía, furtivamente do castelo, levando escondido num avental, alimento para os mais necessitados. Certo dia, abordada pelo rei, seu esposo, que era contrário à prodigalidade, foi indagada sobre o que levava. Meio confusa, respondeu que eram rosas. Ele insistiu para ver. Ela abriu e, de fato, estava repleto de rosas em pleno inverno europeu. A sua institucionalização no início do século XIV, por ocasião da construção da Igreja do Espírito Santo em Alenquer, devido à sua devoção e gratidão ao Divino Espírito Santo por ter sido atendida ...